sexta-feira, 29 de junho de 2012

De Criança e de Violência: Uma Reflexão.



LOPES, Rosa Graciéla
Psicóloga
É assustador o aumento da violência em todo o mundo, sobretudo aquela denominada violência doméstica, praticada em casa, contra crianças e adolescentes. Objeto de estudo em muitas áreas de conhecimento, a violência doméstica é definida por Azevedo e Guerra11 como ação e/ou omissão de pais, parentes ou responsáveis pela criança ou adolescente, sendo capaz de causar à vítima dor ou dano de natureza física, sexual e ou psicológica. Essa ação/omissão implica, além de uma transgressão do poder e dever de proteção do adulto, uma coisificação da infância. É um ato que tira da vítima o direito de ser tratada como uma pessoa que deve ser respeitada e protegida por sua condição de desenvolvimento.
É necessariamente a família o lugar afetivo que proporciona o desenvolvimento saudável da criança, por meio de afeto, cuidados e limites. No entanto, nas últimas décadas, não é isso que temos percebido. Nesta pós-modernidade, mudanças muito rápidas e algumas muito profundas de valores e costumes tem sido causa e efeito de alterações também na vida familiar. Pais e mães precisam trabalhar fora de casa, tendendo a delegar os cuidados e a educação de seus filhos a pessoas pouco ou nada conhecidas. Imagens dramáticas de cenas de maus tratos a criança tem-se tornado uma constante nos noticiários de TV. Por outro lado, crianças e adolescentes tem permanecido expostas a maior parte do dia, não apenas à televisão e aos videogames, mas também ou principalmente aos produtos e programações da internet ou do ciberespaço. Se diante da TV as crianças de nossos dias não são censuradas, assistindo solitária a tudo o que é exibido na telinha, como cenas de banalização e barbarização do sexo e da agressão nas relações pessoais, diante de um computador elas quase nunca são monitoradas, podendo acessar caminhos inapropriados, perambular por “sítios” povoados por tribos, perfis e “fakes” às vezes perigosos ou perigosamente sedutores. Esses jovens telespectadores e internautas tendem a enxergar essas imagens de sexo e agressão como representações do natural e do verossímil. Eles ainda não tem condições de compreender e lidar com o que seus olhos alcançam e acabam absorvendo o que assistem como o normal, o comum e a regra.
Para os pais da atualidade, a vida tem sido corrida e o tempo parece nunca ser suficiente, o que aumenta o estresse e diminui a paciência que precisam ter com os filhos. Ao chegarem em casa do trabalho, estressados e cansados, acabam não dando aos filhos o mínimo necessário da atenção que eles necessitam. Muitas vezes,
(Azevedo, M.A. & Guerra, V.N.A. Violência Doméstica na Infância e na Adolescência, SP, Robe, 1995. )
o pedido de cuidado e atenção de uma criança ou adolescente resulta em conflitos e desavenças, chegando à vivência das culpas por “trabalhar demais”, às “cobranças” entre uns e outros e ao conhecido jogo das “compensações”.
Situações tem havido, em que ter família acaba não sendo uma garantia de saúde mental. Um pedido ou dependência de cuidado pode gerar o desrespeito e a humilhação por parte dos adultos. É quando uma demonstração de carinho físico se converte em toques de pontos inapropriados do corpo da criança ou adolescente fazendo-a sentir-se “esquisita”, envergonhada e culpada. É quando a “apalpação” se transforma em estupro num sentido estrito pelo pai ou padrasto. Tudo isso, pode gerar um estrago na personalidade em formação da criança e adolescente fazer minar a sua autoestima. E nesse contexto específico, a família deixa de ser uma garantia de saúde mental.
Sabe-se, por outro lado, que o ser humano tem a família como uma necessidade básica. Ainda que tenha com a família uma vivência de penúria material e moral, a pessoa quer estar em ou perto dela. Basta ir a um orfanato e conversar com as crianças e ou adolescentes que ali se encontram que poderá ver essa necessidade aflorarem em todas as falas.
Azevedo, M.A. & Guerra, V.N.A. Violência Doméstica na Infância e na Adolescência, SP, Robe, 1995.